- por malu baumgarten -
Cresci em cidade grande, violenta e suja.
Sabia nada das brancuras da neve, tudo do frio
das escolhas poucas, paredes, viadutos, miserê
de pobres. Vi a menina que vivia atrás
duma porta de ferro no Túnel da Conceição,
dormia no barulho do trânsito incessante, ela
com refugiados da vida podre.
Doze ou treze anos, pele cinza, magrinha
de cabelos escorridos, foi violentada no
túnel por um homem fera, fugiu,
não aquele o primeiro. Sumiu como veio
à Rua da Praia dos anos 70.
Saí de lá, e das cidades que vieram depois.
Não escapei de mim, nem de meus demônios.
Assombram-me, ainda na neve pristina
e nova das florestas do Don Valley,
nas árvores nuas vestidas de nuvens
no sol de inverno que parece uma lua por trás
da neblina, na calma fria da luz de fim de tarde
das ruas de Tkaronto, o lugar onde as árvores
encontram a água. Aqui há meninas como aquela.
* Tkaronto é o nome indígena de Toronto.
- fotografia de malu baumgarten
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